sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

O Saga do Herói Tampinha



Pelo menos dois problemas principais pairavam entre as especulações de O Hobbit. Primeiro, a incerteza sobre a direção ser ou não de Peter Jackson, o veterano diretor da trilogia O Senhor dos Anéis. Depois, a desconfiança sobre a decisão aparentemente arbitrária de estender o livro de J. R. R. Tolkien, no qual a produção se baseia, em não meramente um ou dois, mas três filmes.

Pois bem, O Hobbit: Uma Jornada Inesperada, primeira parte da empreitada, não apenas resgata a poderosa capacidade de imersão da primeira trilogia, como a reinventa. Somos apresentados ao séquito de anões reunidos com a intenção de retomar a sagrada Montanha Solitária, onde se encontra um tesouro de valor imensurável, usurpado do domínio-anão pelo vil dragão Smaug. O prólogo narrado pelo célebre Bilbo Bolseiro precisamente antes dos acontecimentos que marcam a Saga do Um Anel é responsável por nos realocar no familiar Condado, e então de volta sessenta anos antes para compreender a injúria cometida contra o Reino dos Anões.

Aliás, para os desabrigados de O Senhor dos Anéis, a forte Sensação de Familiaridade é a primeira coisa que ancora a atenção em O Hobbit, ao reencontrar personagens como Gandalf, Bilbo, Frodo (!), os Elfos, mais tarde Gollum e até mesmo a memória do Condado. Existem ainda algumas referências cinicamente não-camufladas, como Gandalf incapaz de não bater a cabeça no lustre da casa de Bilbo. Outros elos permanecem intactos, como a altivez dos elfos, a intransigência e bom humor dos Anões, bem como a aparente fragilidade dos Hobbits e o transtorno de dupla personalidade do ótimo Gollum (Serkis, arrebentando de novo).

A atmosfera de tensão sufocante presente em SdA dá espaço aqui a um clima mais leve graças, principalmente, ao Humor Bonachão da missiva de nanicos que a trama acompanha. Se o livro (que não li) é conhecido por ter sido pensado para o público infantil, então não surpreende que Peter Jackson, na condição de fã enlouquecido do Imaginário Tolkien, tenha conservado essa característica no filme. Sendo assim, não dá pra esperar que O Hobbit repita o tom de gravidade e a sensação ameaça pungente das duas torres, com o ódio de Sauron e Saruman, o mar de orcs e outras feras bestiais prestes a reduzir a farelos Frodo e Sam. Aqui há perigo e ameaça, sim. Mas salvaguardados por doses bem distribuídas de gracejos (e algumas canções).

Outro ponto positivo é que os cenários incrivelmente abrangentes ajudam a reforçar o contraste entre a imensidão da jornada e seus perigos diante da pequenez dos oponentes Anões e Hobbit. Não falo necessariamente dos planos abertos mostrando a riqueza natural da Nova Zelândia (principal locação), mas observe, por exemplo, o salão do reino de Thrain, a fenda na montanha dos Orcs com seu líder monstruoso, o pico do penhasco onde os heróis são postos em emboscada. Tudo é fruto de um trabalho minucioso de Design de Produção que chega, outra vez, a surpreender. Jackson continua acertando a mão nas lindas sequências de batalhas, ainda utilizando os rasantes maravilhosos que adotou para os Nazgûl que destroem as Minas Tirith em O Retorno do Rei.

Como era de se esperar, Tomadas Perigosamente Longas como a reunião na sala de jantar de Bilbo (duas canções!), a conferência em Valfenda e o extenso jogo de adivinhações entre Bilbo e Gollum, por mais que funcionem impecavelmente bem e que objetivem reforçar a noção de tempo-real, podem causar estranhamento. Outra fragilidade que vai de encontro mais à história do que à narrativa é o fato de que a solução para momentos de enrascada extrema, sempre vem de uma força maior, protetora e provedora, notadamente conhecida por Gandalf, O Cinzento. Seria uma metáfora cristã para o Assistencialismo Divino que nos submete a provações para testar nossas forças, porém não mais além do que podemos suportar? Considero um tanto quanto frustrante a sensação de que os Anões poderiam ter ido pro saco bem antes, caso não contassem com um Mago fodão na equipe. Outro ponto questionável é que, embora responsável por conferir um frescor ao conhecido universo da Terra Média, a trama não dá conta de explorar a contento a Vasta Quantidade de Personagens Novos. Fiquei curioso pra conhecer melhor, por exemplo, o Mago Castanho, versão pitoresca de São Francisco de Assis.

Dosando as impressões, é possível concluir que Uma Jornada Inesperada entrega o prometido, vai além e ainda sela o início de uma aventura que promete passaportes definitivos ao incrível universo da Terra Média. Chupa, haters. Obrigado, PJ.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Festival Casa Cor de Cinema: Programação

[ATENÇÃO: PROGRAMAÇÃO ATUALIZADA]

Sábado (24/11) começa o Festival Casa Cor de Cinema. A seleção de filmes incrivelmente caprichada você encontra logo aí abaixo. O festival acontece dentro da programação da Casa Cor, instalada ali no Casino Maranhense, na Beira-Mar. Atenção para o valor das entradas:

Terça a Quinta: R$ 20 inteira | R$10 meia
Sexta e Sábado: R$ 30 inteira | R$ 15 meia
Domingo: R$ 15 preço único

Lembrando que uma entrada garante acesso a todos os filmes que serão exibidos no dia - e a todo o espaço do Casa Cor, claro. Festival lindo, preços ridículos. Anotemos os filmes e vamos lá! :-D

Dia 24 – Sábado


16:15 Crazy Horse (EUA, 2011) – 118 min. – Cine HTCenter
18:30 A Música Segundo Tom Jobim (Brasil, 2012) – Praça Casa Cor
20:15 Cosmópolis (França/Canadá/Portugal/Itália, 2012) – 106 min. – Praça Casa Cor


Dia 25 - Domingo


15:00 O Mundo Dos Pequeninos (Japão, 2011) – Animação - 94 min. – Cine HTCenter
16:30 Saturno Em Oposição (Itália, 2011) – 108 min. – Cine HTCenter
18:20 Sete Dias Com Marilyn (EUA, 2011) – Praça Casa Cor


Dia 28 – Quarta


16:45 A Vida Útil: Um Conto De Cinema (Uruguai, 2010) – 70 min. – Cine HTCenter
18:00  Drive (EUA, 2011) – 110 min. – Praça Casa Cor
20:00 L’Apollonide – Os Amores Da Casa De Tolerância (França, 2011) – 120 min. – Praça Casa Cor


Dia 30 – Sexta 


16:30 Azul Profundo (Grécia, 2011) – 90 min – Cine HTCenter
18:10  Aquí é o meu lugar (EUA, 2011) – Praça Casa Cor
20:00 Beije-Me Outra Vez (Itália, 2011) - 139 min – Praça Casa Cor

Dia 02 – Domingo


15:00 Um Gato em Paris (França, 2011) – Animação - 70 min. – Cine HTCenter
16:10 Que Mais Posso Querer (Itália/Suíça, 2010) – 120 min. – Cine HTCenter
18:10 Heleno (Brasil, 2012) – 100 min. Praça Casa Cor





segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Menino Burton e o Cachorro-Frankenstein



Lá vem ele outra vez com todo o seu arsenal gótico, sua coleção de olheiras macabras, seus vultos e sombras. Alguém ainda tem paciência para o Sr. Timothy William Burton? A resposta é um sonoro e levemente desesperado “SIM! ! !” Mas seja como for, pelo menos os fiéis escudeiros Johnny Depp e Helena Bonham Carter ficaram de fora desse Frankenweenie (Frankenweenie, 2012), onde Burton comprou passagens de volta ao começo da carreira, com a milenar técnica de animação em stopmotion e a história do garoto cientista que ressuscita seu cachorro morto.

Frankenweenie ganha fácil dos dois últimos – e fracotes – lançamentos do pai de Edward Mãos de Tesoura. A despeito do incrível sucesso de bilheteria, Alice e Sombras da Noite fizeram o público ter saudade daquele Demoníaco Barbeiro da Rua Fleet (Depp e Carter gracejando nos três). O trunfo do Cachorro-Frankenstein está basicamente na coleção infinita de referências e citações espalhadas ao longo da trama (quem viu os filmes de Boris Karloff, Peter Lorre, Vincent Price, Bela Lugosi e Christopher Lee: segure os orgasmos) e principalmente por ser uma história que fala do amor muito genuíno de uma criança e seu bicho de estimação.

Como sempre ótimo na criação de tipos que transitam entre a fronteira do sinistro e hilário, Burton entrega um filme criativo, agradável e estranhamente novo, mesmo depois de tantas trevas. Particularmente eu tenho curiosidade de vê-lo trabalhar num projeto ensolarado, moderno e insuportavelmente cheio de alegria, só pra ver como fica.

"It's Alive!"

Ruby Sparks encontra o Jovem Woody Allen



A sombra do primeiro sucesso pode ser esmagadora para um artista. É assim a vida do escritor prodígio Calvin Weir-Fields (Paul Dano), que escreveu um best-seller aos 19 anos e passou a ser tido como um gênio (“Não use essa palavra”, ele repete) desde então. Mas dez anos depois, diante das cobranças para um novo romance, ele só consegue se ver afogado num imenso mar de folhas brancas, sem ideia alguma.

Recorrendo às recomendações de seu analista e aos conselhos predadores do irmão mais velho, o bloqueio criativo de Calvin só é interrompido quando ele sonha com essa garota angelical, de cabelos inacreditavelmente vermelhos, puro mistério. A musa inspiradora é a tal da ‘faísca ruiva’ (daí o título ‘Ruby Sparks’) que faltava pra que um novo livro começasse a ser escrito. O detalhe é que algumas páginas depois, Ruby Sparks (Zoe Kazan, que também assina o roteiro) aparece em carne, osso e roupas de baixo na casa do Calvin, preparando o café da manhã.

Esse é o plot do novo filme da dupla de diretores que nos trouxe ‘Pequena Miss Sunshine’, Jonathan Dayton e Valerie Faris. Mas aqui a namorada ideal não é fruto de uma mente esquizofrênica, como foi o caso do personagem parcialmente maníaco de Selton Mello em ‘A Mulher Invisível’. Ela também não é uma boneca-para-fins-recreativos, como a namorada de Ryan Gosling em ‘A Garota Ideal’. E o principal: ela não é consciente da sua condição de personagem, como o Will Ferrell em ‘Mais Estranho que a Ficção’.

Sendo assim, qualquer alteração que o afortunado Calvin Weir-Fields decida fazer em seu texto, reflete diretamente no comportamento de Ruby. Algo que leva o protagonista a uma desgastante crise de valores éticos. Alterar a personalidade de Ruby é brincar de Deus, ele poderia pensar. Até onde sua namorada deixa de agir espontaneamente pra ser um mero fantoche guiado pelas teclas de uma máquina de escrever?

Tecnicamente cuidadoso, o design de produção investe num interessante contraste dos personagens com o cenário principal do filme, a casa do jovem romancista. Uma versão do Woody Allen com 29 anos, recluso e retraído, sempre usando roupas de tons claros, Calvin quase desaparece pelas paredes brancas da casa super-monocromática. Já Ruby é sempre cor viva (vermelho e roxo, principalmente) remetendo ao caráter vivaz e inspirador da personagem. As participações de Annette Bening e Antonio Banderas como os excêntricos pais do protagonista, também ajudam a engrossar o caldo com bons personagens e situações.

Notei que depois que a primeira complicação é resolvida (entender a natureza de Ruby e se convencer de que “não, eu não estou ficando louco”) o ritmo da narrativa sofre uma leve desacelerada até pegar o embalo outra vez. Mas Ruby Sparks continua sendo uma história romântica, criativa e sem grandes pretensões sobre a matemática incrivelmente complexa dos relacionamentos amorosos, nossa necessidade de ser notado e as diferenças definitivas entre os dois lados da moeda.


Ruby Sparks - A Namorada Perfeita (Ruby Sparks, 2012)

Direção: Jonathan Dayton, Valerie Faris

Elenco: Zoe Kazan, Paul Dano, Chris Messina, Antonio Banderas, Annette Bening, Steve Coogan, Deborah Ann Woll


domingo, 4 de novembro de 2012

Dossiê Vincent Price

Primeiros Anos

Um porte longilíneo e aristocrático, os cabelos rigorosamente emplastrados, trajes de corte fino, o olhar imponente e, acima de tudo, uma voz cortante, poderosa. Essas são características que inevitavelmente guiariam o então jovem ator Vincent Price pelos caminhos dos filmes de horror, pelos quais ele se tornaria reverenciado anos depois. 

Ter nascido no mesmo dia de Christopher Lee (27 de maio de 1911), outra lenda dos horror movies, parece predestinação agourenta. Mas do começo de carreira no teatro, em espetáculos da Broadway, foi um curto caminho até que Price carimbasse o passaporte para Hollywood, a princípio estrelando papeis dramáticos, notadamente secundários. Um dos personagens mais marcantes dessa primeira fase foi em “Laura” (1940), um clássico do cinema noir dirigido por Otto Preminger. Price é um dos suspeitos pelo assassinato da linda moça do título, interpretada por Gene Tierney. Os dois voltariam a se encontrar em outro filme marcante do período, “Amar Foi Minha Ruína” (1945), um dos primeiros em technicolor. Price vive o marido que é inescrupulosamente trocado pelo novo interesse romântico da protagonista.


Construindo a Persona



No ano seguinte, “Choque” (1946) traz Vincent Price como o maquiavélico psiquiatra Richard Cross, assassino da própria esposa, que transforma lentamente em um inferno a vida da única testemunha do crime. E aqui um traço interessante da persona de Price, ainda em construção: a postura ambígua, insuspeita, propicia a ele a possibilidade de enganar a seus pares na trama e a nós, na plateia.

Depois de trilhar pelos estúdios da Universal e Fox, Vincent Price estrela, pela Warner, este que talvez seja seu primeiro grande sucesso na esteira dos filmes de horror: “Museu de Cera” (1953). Ele interpreta Henry Jarrod, um escultor que cria impressionantes imagens realistas de personalidades históricas para o museu do título. O afinco com que Jarrod produz suas obras é tamanho, que ele as trata como pessoas reais, com alma e personalidade. O problema começa quando seu sócio decide incendiar o museu a fim de ficar com o dinheiro da hipoteca. Jarrod, na tentativa de salvar suas criações, fica preso no salão, carbonizado junto a seus amigos de cera.  Depois da carga dramática gigantesca de prólogo, o escultor regressa, como uma figura bestial, em busca de vingança.

E aqui nós temos outro elemento importante para a composição da Lenda Vincent Price: o personagem injustiçado por fatores incrivelmente aleatórios regressa com um plano de vingança maléfico de assassinato em massa, ou coisa que o valha. Esse plot ainda seria usado inúmeras vezes em outros personagens do ator.
Em 1958, “A Mosca da Cabeça Branca” confere um enorme sucesso à Fox e se torna outro marco interessante na carreira de Vincent Price - apesar de ser um personagem coadjuvante. A história do cientista que desenvolve uma máquina de teletransporte, cujas experiências resultam numa criatura horrenda. Um filme de ficção científica em narrativa inversa, intercruzando o estilo noir.


Porta de entrada para Terror B



No ano seguinte, “A Casa dos Maus Espíritos” (1959) celebra a entrada definitiva de Price no universo dos chamados ‘Filmes B’, aqui desmembrado em ‘Terror B’. Essa designação caracteriza uma alternativa adotada pelos estúdios de produzir filmes com menor orçamento e sem grandes estrelas no elenco. Utilizando sobras de cenário e figurino de outras produções e soluções engenhosas de filmagem, os ‘Filmes B’ eram exibidos após os lançamentos principais, nas populares sessões duplas que começam na década de 1950. Os estúdios buscavam com isso reconquistar um público cada vez mais seduzido pela novidade da Televisão.

Nos filmes de Terror B, os relevos de influência Expressionista entram em conflito com o viés discretamente cômico, muito característico desse subgênero. Além da camada estética frequentemente sobrepujando aspectos psicológicos: caveiras animadas precariamente, aparições e vultos conferem ao filme uma identidade farsesca, quase de fábula. “A Casa dos Maus Espíritos” traz a figura de Price como o milionário excêntrico que decide desafiar pessoas anônimas a passarem uma noite nessa mansão escabrosa, a troco de receber 10 mil dólares como prêmio. Dirigido por William Castle, um dos nomes mais importantes do Terror B. A partir da repercussão positiva, muitos outros filmes foram sendo produzidos, seguindo os mesmos padrões e em intervalos bem curtos, em tempo record de produção.



O Poço e o Pêndulo” (1961) assim como "Muralhas do Pavor", “O Castelo Assombrado” (1963) e “O Corvo” (1963) são bons exemplos. Pertencem a uma série de filmes estrelados por Price e dirigidos por Roger Corman, com base em contos macabros de Edgar Allan Poe. A ambientação no séc. XVI, frias paredes de castelos cheias de histórias, figurinos pomposos, quadros assustadores, o tema da reencarnação e maldições familiares. São incontáveis os elementos que ajudam a construir uma iconografia muito bem definida na tríade Poe-Corman-Price. É uma bela safra.

  
O Cientista Excêntrico




Em “No Domínio do Terror” (1962) outro aspecto definitivo da Filmografia Price é estabelecido: a figura do cientista possuído pela ambição de seus estudos, geralmente com motivações românticas. Aqui são apresentadas três histórias sem conexão entre si. Na primeira, velhos amigos descobrem uma curiosa fórmula da juventude e tentam, depois de rejuvenescer coisa de 50 anos, ressuscitar a falecida esposa de um deles. Na segunda história, "A Filha de Rappaccini", remotamente baseada no conto de Rapunzel, um cientista mantém a filha sob uma espécie de antídoto que a impede de se relacionar com outras pessoas - até que ela se apaixona.

A figura do cientista emocionalmente desequilibrado voltaria mais tarde em “O Abominável Dr. Phibes” (1971), um dos personagens mais populares de Vincent Price. Depois de perder a esposa num procedimento cirúrgico mal sucedido, Dr. Phibes elabora um plano de vingança macabro baseado em pragas do Antigo Testamento. Um a um os médicos envolvidos vão sendo assassinados com requintes de crueldade. Dr. Phibes volta em  "A Câmara de Horrores do Dr. Phibes" (1972).

A fórmula vingancista é repetida em “As Sete Máscaras da Morte” (1973), com trama e personagens claramente similares aos de Dr. Phibes, realocados. Um ator frustrado decide executar os críticos teatrais que o execraram – aqui os assassinatos são minuciosamente baseados em peças de Shakespeare.


O Mestre do Horror



Fora das telas, Price era um apreciador e colecionador de obras de arte, tendo se formado em História da Arte em Yale. Ele também foi um gourmet inveterado, inclusive tendo se dedicado à culinária, co-escrevendo livros de receitas e participando de programas de televisão – é até engraçado imaginar Dr. Phibes ensinando a fazer enroladinhos de camarão.

Contemporâneo de mestres como Bela Lugosi, Boris Karloff, Peter Cushing e Peter Lorre, além do já citado Christopher Lee, a longa filmografia de Vincent Price, que se estende ao longo de quase cinco décadas, o estabelece solidamente no Olimpo do Horror cinematográfico. No entanto, seu legado não se limita ao cinema, já que sua voz inconfundível está cravada num dos clipes musicais mais famosos de todos os tempos: é dele a narração cavernosa e a gargalhada fatal em ‘Thriller’, de Michael Jackson. Sua última participação no cinema foi em “Edward Mãos de Tesoura”, de Tim Burton – um dos muitos discípulos do Mestre do Horror.

domingo, 28 de outubro de 2012

Saldo da Maratona Vincent Price

Chegou ao fim a Maratona Vincent Price. Exibimos os cinco filmes num Cine Praia Grande todo ornamentado com teias de aranha, morcegos, aranhas gigantes e até o nosso camarada esqueleto, o Alvinho. O evento contou com a cobertura da TV Guará, numa entrevista de dois blocos no Programa M. A turma do programa Chega Aí, da TV Cidade, esteve lá conferindo uma das sessões - a reportagem vai ao ar na segunda-feira, dia 29. A Maratona também foi destaque na Agenda Na Mira da TV Mirante e no Caderno Alternativo do jornal O Estado do Maranhão.

O programa Chega Aí conferindo a Maratona
A equipe do Núcleo de Cinema com o Mário do CinePG e o esqueleto Alvinho
Com Paula Barros e Paula Veloso no estúdio do Programa M
Público aguarda a primeira sessão

O Núcleo de Cinema da 7ª Mostra SESC Guajajara de Artes agradece aos mais 280 expectadores que compareceram às cinco sessões nos dois dias de exibições. A gente acredita que frequentando e incentivando, mais eventos assim podem e devem acontecer na nossa cidade. (:


E a programação de Cinema continua na semana quando faremos exibições em várias escolas da rede pública. À tarde levaremos alunos do ensino fundamental e médio ao Cine Praia Grande para sessões exclusivas e mediadas. E à noite começa o Workshop sobre produção de Curtas-Metragens com o Lucian Rosa - as inscrições já estão encerradas.

Para conferir a programação completa da 7ª Mostra SESC Guajajara de Artes, clique aqui.


sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Workshop Curta-Metragem

NÚCLEO DE CINEMA

7ª MOSTRA SESC GUAJAJARA DE ARTES

WORKSHOP CURTA-METRAGEM: DA PRÉ-PRODUÇÃO À PÓS-PRODUÇÃO


A ideia de um workshop sobre a produção de curtas-metragens surgiu do interesse que muitos alunos de outras atividades do SESC tiveram, sempre perguntando sobre técnicas de montagem, filmagem e outros detalhes envolvidos na elaboração de um filme. 

O ministrante da Oficina é Lucian Rosa, jornalista e cineasta. Ele estudou na PUC-SP, Academia Internacional de Cinema e na ESPM. Dirigiu um documentário e dois filmes de curta-metragem, além de ter participado de vários outros curtas nas mais diferentes posições. Na produtora CrossContent fez matérias pro IG e TERRA e ainda editou o webdoc vencedor do Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos. Seu último trabalho foi na produção do longa-metragem O GORILA, de José Eduardo elmonte, com Mariana Ximenes, Otávio Muller e Alessandra Negrini.

Nas palavras do próprio Rosa, a Oficina "pretende mostrar na prática como se constrói um curta-metragem. Passando pela pré-produção, produção e pós-produção, os alunos vão criar seus roteiros, filmá-los e editá-los. Porém, o principal objetivo da oficina não é os alunos saírem com um curta-metragem pronto, mas sim, com uma equipe formada que consiga fazer cinema após o término das aulas".

As vagas são super limitadas. Para fazer a sua inscrição, entre em contato com a Galeria de Artes do SESC por telefone ou email. 

(98) 3216 3830 ou galeriadeartesescma@gmail.com

WORKSHOP CURTA-METRAGEM: DA PRÉ-PRODUÇÃO À PÓS-PRODUÇÃO
Dias 29, 30 e 31 de Outubro
Galeria de Artes do SESC - Praça Deodoro
Das 18h às 21h. 

Leia também sobre a Maratona Vincent Price

E para conferir a programação completa da Mostra SESC Guajajara de Artes, clique aqui.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Maratona Vincent Price - Programação

O Núcleo de Cinema da 7ª Mostra SESC Guajajara de Artes promove a Maratona Vincent Price nos dias 26 e 27 de outubro, no Cine Praia Grande, no Centro Histórico de São Luís - com entrada franca. Serão cinco grandes filmes e mais um bate-papo sobre o Mestre do Horror. Aqui você confere as datas, horários e sinopses:

Dia 26/10

01 - No Domínio do Terror (Twice-Told Tales, 1963) - 21h10


Trilogia de curtas baseados em contos de Nathaniel Hawthone: Em "O Experimento de Heidigger" um cientista descobre uma incrível fórmula para o rejuvenescimento, mas as conseqüências se mostram assustadoras; Em seguida,  "A Filha de Rappaccini", uma versão remotamente baseada na famosa história de "Rapunzel", onde um obcecado cientista (Price) mantém a filha cativa. Finalmente, "A Casa das Sete Agulhas", na Nova Inglaterra, em 1691, vários inocentes foram executados acusados de bruxaria. 150 anos depois, Gerald Pyncheon (Vincent Price) retorna para a casa amaldiçoada onde seus ancestrais morreram.

2 - As Sete Máscaras da Morte (Theatre of Blood, 1973) - 23h


Depois de anos interpretando Shakespeare no teatro, o veterano ator Edward Lionheart (Vincent Price), é rechaçado pela crítica especializada no ponto mais alto de sua carreira. Tido como morto, ele regressa com um plano macabro: um a um, os críticos de sua obra vão caindo, mortos. A onda de horríveis assassinatos é minunciosamente inspirada nas peças do escritor inglês.

Dia 27/10

3 - O Abominável Dr. Phibes (The Abominable Dr. Phibes, 1971) - 19h30


Depois de uma equipe de cirurgiões ser mal-sucedida na operação de sua amada esposa, o que a levou a morte, o emocionalmente perturbado Dr. Phibes (Price) formula uma macabra receita de vingança. Usando a Bíblia Sagrada como seu guia, Phibes desencadeia sobre seus inimigos uma série de atrocidades baseadas no velho testamento, levando a história a um final totalmente inesperado.

  • Bate-Papo com Stella Aranha, Amanda Silva e Davi Coelho - 21h05

4 - O Corvo (The Raven, 1963) - 21h40


Dirigido pelo mestre Roger Corman e baseado no poema gótico de Edgar Allan Poe, O Corvo reúne pela primeira vez Peter Lorre, Boris Karloff e Vincent Price. A história é sobre dois bruxos que duelam pela supremacia na magia. No elenco, um Jack Nicholson ainda em início de carreira. O poderoso feiticeiro Dr. Erasmus Craven (Price) vive recluso em seu castelo, de luto pela morte de sua esposa. Numa noite, entra pela janela um corvo que se revela como o feiticeiro Dr. Bedlo (Lorre), transformado na ave após um duelo de magia com o maligno Dr. Scarabus (Karloff). Craven o ajuda a voltar ao normal e Bedlo quer retornar ao castelo de Scarabus para a revanche.

5 - A Casa dos Maus Espíritos (House on Haunted Hill, 1959) - 23h10


Frederick Loren (Price) é um milionário excêntrico que propõe um desafio a cinco pessoas desconhecidas: passarem uma noite em uma mansão assombrada, sem poder sair do local até o amanhecer. O prêmio para cada uma que chegar viva será de US$ 10 mil. Se no início tudo parece uma divertida brincadeira, após a meia-noite as coisas vão ficando cada vez mais sinistras...

Até lá! :-)
Clique aqui para conferir a a programação completa da 7ª Mostra SESC Guajajara de Artes

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Cinema na Mostra SESC Guajajara 2012

A 7ª Edição da Mostra SESC Guajajara de Artes está para começar. Para esse ano, o Núcleo de Cinema prepara duas grandes atividades: A Maratona Vincent Price, com cinco filmes do mestre do horror e o Workshop de Curtas-Metragens, ministrado pelo Jornalista e Cineasta Lucian Rosa. O Núcleo de Cinema também vai buscar alunos nas escolas e levá-los ao Cine Praia Grande para exibições e mediações exclusivas. Em breve, essa postagem vai sendo atualizada com mais informações sobre as nossas atividades. Por enquanto, cliquem nos flyers e fiquem ligados :-D



terça-feira, 2 de outubro de 2012

Cinema e Distribuidoras no SESC


Mais um encontro do maravilhoso Núcleo Experimental de Estudos Sobre Cinema, promovido pelo Projeto CineSESC. O grupo de discussão se reúne mensalmente, em meio a café e biscoitinhos, para conversar sobre diversos temas relacionados ao meio cinematográfico. Já falamos sobre Nouvelle Vague, Stanley Kubrick, Pedro Almodóvar, Quentin Tarantino, Animações Japonesas, além de muitos outros. 
Dessa vez, o tema será o quase sempre nebuloso papel das Distribuidoras de Filmes. Para ministrar o debate, convidamos o Diretor da Petrini Filmes, casa de distribuição maranhense, o grande Raffaele Petrini. Entre alguns tópicos a serem abordados, estão:

- Distribuição Cinematográfica: O que é e como funciona. Da aquisição nos festivais até o lançamento.
- Desafios: Impor o filme no circuito nacional.
- Cinema independente X Cinema blockbuster: diferenças no processo de distribuição.
- Processo de distribuição de obras nacionais.
- O fim da película: processo de digitalização nas salas brasileiras.

Imperdível. Reforçando mais uma vez o convite a todos: 

Núcleo Experimental de Estudos sobre Cinema

Tema: “Cinema e Distribuidoras”
Mediador: Raffaele Petrini
Data: 04/10 (5ª feira)
Horário: 18h30
Local: Galeria de Arte – SESC Administração
Informações: galeriadeartesescma@gmail.com ou pelo telefone: (98) 3216 3830


domingo, 26 de agosto de 2012

Curso: Introdução à Linguagem Cinematográfica



Na terça-feira (28) começa o nosso curso de Introdução à Linguagem Cinematográfica. Essa é a terceira vez que ministro pelo SESC uma oficina/curso totalmente voltado a estudar a maravilhosa engenharia da sétima arte. E a oportunidade é incrível. São pessoas com aspirações e opiniões diferentes, unidas ali pela pura e simples vontade de debater, discutir, aprender mais sobre a arte mais linda de todas: o cinema.

Em maio de 2011, a oficina “Nouvelle Vague - Análise de Filmes” analisou a relação tão criativa quanto abrasiva mantida por François Truffaut e Jean-Luc Godard. Nós procuramos compreender a importância dos filmes e de seus criadores, navegamos pelos respingos de Nouvelle Vague pelo resto do mundo, inclusive no Brasil.

Já no começo do ano, a oficina de “Análise de Filmes” reuniu uma turma sensacional. Tinha gente de todas as idades, de estudantes a professores, de psicólogos a cineastas começando a carreira. E foi uma experiência muito gratificante se reunir com esses camaradas todo dia, bem cedo da manhã, pra falar de cinema até a hora do almoço.

Para essa nova edição, os horários foram reajustados - agora é à noite - pra que fosse acessível a mais gente. A responsabilidade aumenta, mas a maior duração do curso (uma semana inteirinha), vai nos permitir mais divagações, mais trechos de filmes, mais papo sem muito medo de não cumprir o cronograma. Nos vemos lá! 

Informações:

(098) 3216 3830
galeriadeartesescma@gmail.com


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Qual é a tua, Christopher Nolan?


O trabalho do diretor, roteirista e produtor Christopher Nolan divide opiniões. De um lado, os fãs entusiastas que o arremessam à categoria de gênio inconteste do cinema. De outro, aqueles que enxergam artimanhas manipuladoras em Nolan e defendem que seus filmes não passam de lorota emplumada. Seja como for, longe de prever o prazo de validade dos filmes, cabe a nós o desafio de procurar compreender seu peso agora, no frescor dos lançamentos. Afinal de contas, o que faz do Sr. Nolan um diretor tão festejado?

Levando em consideração os intrépidos ‘blockbusters com cérebro’ – um termo cunhado pelos fãs do realizador – é possível observar uma estrutura comum bastante simples. Na primeira hora somos bombardeados com esse arsenal de informações, respostas, dramas e conflitos que nos fazem ter a sensação de ter tomado três tequilas + chacoalhada na cabeça. É uma espécie de Ilusão de Complexidade que serve pra que a história ganhe substrato e as informações que realmente importam estejam todas ali, camufladas.

O desfecho investe nos set pieces (aquelas cenas bem marcantes) e alguns diálogos expositivos pra deixar as coisas menos obscuras e nos oferecer o confortável Complexo de Sherlock Holmes “Sou demais! Entendi tudo!”. E aí não dá outra: o desfecho impressiona. Se vistos mais de uma vez, no entanto, a maneira afetada com que Nolan apresenta suas tramas pode ser frustrante pela sensação de concha vazia “Poxa, não é tão complexo assim. Na verdade é até bem simples. (...) Pfff, então é só isso?!”.

A despeito disso, uma marca que se tornou característica de Nolan – e que ele adota com sofreguidão quase religiosa na trilogia Batman - é o Apego ao Realismo. Pragmático desde o início da carreira, o diretor procura empregar respostas aos mínimos detalhes, transformando a existência de um homem numa roupa de morcego em algo o mais plausível possível. Assim, o boa-praça Lucius Fox (Freeman) atende a esse propósito explicando todo e qualquer artefato que o vigilante mascarado venha a utilizar (e a gente compra tudo, inclusive com muito amor).

Para ficar em alguns exemplos, a atroz bate-motoca que surge no segundo filme, é um modelo meticulosamente projetado e que funciona de fato. Uma Lamborghini é parcialmente destruída, o Hospital de Gothan (um prédio aleatório) é de fato implodido e aquele caminhão dá mesmo uma cambalhota no meio da rua. Tudo isso, a partir do segundo filme, captado com as poderosas câmeras IMAX, que fornecem uma qualidade muito superior de imagem e som. Essa medida de utilizar o mínimo de computação gráfica visível (aquela mais aparente, como a bate-nave (!) nesse último filme) não é outra coisa senão uma estratégia para conferir mais verdade à narrativa. Funciona.


Essa característica corresponde ao cuidado extremo com a Identidade Visual dos filmes. Para a trilogia do Cavaleiro das Trevas, foram adotadas paletas de cores bastante específicas. Observe a tonalidade amarronzada, quase sépia, que toma conta de Batman Begins. Em Dark Knight, a coloração já é mais azulada. Finalmente em Dark Knight Rises os tons cinzentos estão presentes desde o logo da Warner, abrindo o filme. Isso pode servir a interpretações condizentes à história sim, mas servem para criar um gratificante banquete aos olhos – o que é lindo, não? Somem-se a isto as impressionantes sequências com a arquitetura sinuosa em A Origem ou a icônica imagem do homem-morcego sendo fisgado por aviões em Gothan e temos aí filmes marcantes e visualmente ambiciosos.

Importante também é o criterioso cuidado de Nolan com a Direção de Atores. É claro que contar com uma equipe infernalmente talentosa ajuda bastante. Mas as instruções pontuais do diretor são fundamentais para extrair performances notáveis do elenco. Afinal, é ele quem detém a visão holística do projeto do qual os atores correspondem apenas a uma parte. Dessa forma, os monstruosos diCaprio, Bale, Ledger, Oldman, Caine... podem oferecer o máximo de talento em suas caracterizações.

E a cereja do bolo, bons amigos, é a Trilha Sonora orquestrada por Hans Zimmer. Impactante mas jamais inconveniente, a música de Zimmer valoriza as sequencias, empolga e até diverte. Desde o ‘booooooommmm’ de A Origem com a interessante mixagem de “Non, je ne regrette rien”, até os surtos graves que seguem as traquinagens do homem-morcego.

No começo do mês, Christopher Nolan deixou suas marcas na Calçada da Fama, no famoso Teatro Chinês de Hollywood. Ele agora decidiu abandonar os filmes de herói e voltar sua carreira a projetos originais. Apesar das críticas - algumas contundentes, outras que apenas implicam com o status hype do diretor – ele segue se esforçando para que as marcas não sejam apenas de cimento na Calçada da Fama, mas definitivas na memória do cinema. A gente agradece. 

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Valente: A Princesa da Pixar [Parte 1]

Olá, amigos. Resolvi dividir esse texto em duas partes [SEM SPOILERS]: a primeira pra falar sobre o filme em si e a segunda, só pra explorar aqueles famosos detalhes caprichados que são a cara da Pixar. Vamo nessa!

Parte 1: O filme


Através da obstinação da princesa Merida em fazer seu próprio destino, a trama de Valente (Brave, 2012) se esquiva a todo custo da tônica romântica e maniqueísta que circundou a maioria todas as princesas do estúdio do velho Walt. E aí o enigma se resolve: depois de Woody, Buzz, Wall-E e Carl Fredricksen, a primeira protagonista da Pixar tinha mesmo que ser uma princesa.

Longe da imensa lista de responsabilidades previamente impostas às mulheres, Merida parece orgulhosa dos cabelos ruivos que ela mantém rigorosamente desalinhados. Os cachos de fogo vão de encontro à vivacidade gasta nos passeios com o cavalo Angus ou na admirável habilidade com arco e flecha. Mas em ‘Valente’ o casamento é ferramenta de diplomacia. Em nome da honra de toda uma dinastia e a fim de assegurar a paz no reino, a mãe da protagonista, Elinor, é uma metralhadora de regras que pretendem conduzir Merida ao matrimônio. E é o conflito entre as duas que rege o tom da trama.


A despeito da aparente sisudez da rainha, a dinâmica familiar é pura comédia. O ‘humor trapalhão’ adotado aqui conta como recurso a favor tanto de desviar a expectativa de romance que vem pré-acionada numa ‘história de princesa’, como de aliviar a tensão crescente entre mãe e filha. E a forma como os homens são retratados nessa produção assumidamente feminista, não deixa de ser curiosa: sempre munidos de força bruta e dispostos a abrir mão de qualquer conversa para resolver tudo na base dos socos e pontapés.

Assim, o rei Fergus é um guerreiro nato que derrotou ursos ferozes, mas é incapaz coordenar o reino ou de por ordem à própria mesa - também por conta dos adoráveis trigêmeos acrobatas. Os pretendentes de Merida, assessorados por seus pais, também rendem boas risadas. São os clãs MacGuffin, Dingwall e Macintosh - este último faz referência aos primeiros computadores concebidos por Steve Jobs, um dos mais importantes acionistas da Pixar, a quem o filme é dedicado.


‘Valente’ se torna interessante ainda ao remodelar outro aspecto caro às histórias de princesa: o elemento fantasioso, geralmente concentrado na figura de um feiticeiro ou bruxa. Recusando o usual maniqueísmo, aqui a bruxa funciona como uma espécie de gênio da lâmpada ou curinga - e as chamas azuis que sinistramente convidam a protagonista a adentrar na floresta escura de alguma forma remetem à mística dos filmes do estúdio Ghibli.

Aí sobra espaço para o que realmente importa nessa história: há uma cena extremamente representativa em que Merida, a fim de manusear melhor seu arco, solta os cabelos presos pela mãe e rasga o belo vestido com a qual fora apresentada a seus pretendentes. Não há simbolismo mais contundente que a recusa desses adornos femininos, a negação do casamento arranjado, a obstinação cega e o desejo de escrever a própria sorte. 

Leia também:





A Arte de Valente [Parte 2]


Com o passar do tempo, os recursos tecnológicos se tornam mais precisos, técnicas de animação são aprimoradas e a cada novo filme da Pixar, o cuidado com os detalhes se torna mais impressionante. Dessa vez a equipe viajou para a Escócia (onde o filme se passa) pra aprender a usar arco e flecha, trajando aqueles kilts medonhos. O intenso trabalho de pesquisa rendeu os belos cenários e incríveis texturas usadas em ‘Valente’. Compare os cabelos dos personagens aqui, com os de ‘Os Incríveis’ (2004), por exemplo. Os fios são plantados um a um e dessa vez eles são menos plásticos e mais soltos. E observe os tecidos, costuras e botões – há uma cena em que Merida se deita num sofá, triste com um acontecimento da trama, e é possível ver os pequenos detalhes do vestido contra a luz.


É interessante também o design de produção dos personagens em si. Já comentei como a rebeldia dos cabelos de Merida vai de encontro à personalidade dela. A mesma lógica é adotada pra todo mundo. Na cena em que a Rainha Elinor prende os cabelos da filha, a moça insiste em deixar pelo menos uma mecha solta. E é intrigante notar que a beleza dessa princesa não é clássica como a da Bela Adormecida ou Cinderela. É uma menina arqueira, traquina e cheia de personalidade. O Rei Fergus é o meu preferido. Como ‘Rei Urso’, ele é um homenzarrão, um armário. Usa uma túnica de pêlo de urso que faz com que ele, de costas, lembre um urso de fato. E os membros dos clãs, pais e filhos, também são caricatos e extremamente engraçados, reforçando o tom jocoso com que os homens são representados aqui, já que o destaque em Valente é mesmo para as mulheres. 


A casa da bruxa é cheia daqueles eggs espalhados por todos os filmes da Pixar. Há uma miniatura do carro da Pizza Planet (repare na mesa) e um monstro Sully talhado em madeira (esse eu não consegui perceber enquanto assistia). Do lado de fora, na floresta, pensei ter visto um Mickey escondido nas folhagens (o formato de três bolinhas da cabeça do camundongo está em todos os filmes, desde Toy Story). E a gag do autoatendimento é hilária: “Derrame a poção 01 se deseja fazer uma reclamação”.

E aqui eles conseguiram criar metáforas visuais muito fortes, como o corte na tapeçaria, o vestido rasgado de Merida ou uma cena em que as cores empalidecem a ponto de ficar tudo quase em preto e branco. Também fiquei surpreso com os ursos, especialmente o poderoso Mor’du, que assusta de verdade. Pra aproximar o formato das histórias clássicas de princesas Disney, em Valente a protagonista até canta algumas músicas, mas nunca em formato de vídeo clip (!), como era antigamente. 

O cuidado com os detalhes é um grande diferencial do estúdio. Será que a história da princesa Merida vai render um novo Oscar pra turma do John Lasseter? ;)

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Valente: A Princesa da Pixar [Parte 1 - Resenha do filme]

Rapunzel Reloaded: A Nova Safra de Princesas Disney

Carros 2: O Excelente Filme Ruim da Pixar


quinta-feira, 12 de julho de 2012

Os Maiores Vacilos do Novo Aranha

Dá pra fazer um leve exercício de memória e lembrar que nenhum filme do cinema recente dividiu tanto opiniões quanto esse reboot da série Homem-Aranha. Ame-o ou Deixe-o, há quem lance a sentença como teia. Entre mortos e feridos, a empreitada do diretor Marc Webb tem coragem, vontade... mas trupica nos detalhes. Quais as maiores desvantagens e vacilos do novo cabeça-de-teia? 

1) Veio depois da trilogia do Sam Raimi


Sim, amigos. Com um parâmetro de comparação tão violento, o novo Aranha perde a força da novidade e precisa de muito mais esforço para conquistar seu lugar. A trilogia do Sam Raimi (embora a gente ignore solenemente o terceiro filme) é de uma força imensa. Foi um fenômeno sem precedentes na história da telona e tatuou em nossas memórias a figura de Tobey Maguire como Peter Parker - um personagem, até então, sem rosto. Some-se a isso a pouca distância de tempo entre as produções e temos aí a Síndrome do Substituto Indesejado. Imagine um novo Tony Stark que não seja Robert Downey Jr., um Harry Potter que não seja Radcliffe ou um Batman que não pareça Kermit, o Sapo.

2) O sacrifício vão de Ben Parker

Um dos momentos mais íngremes da ópera soturna que é a vida pessoal de Peter Parker, a morte do Tio Ben é o destino arrancando dele, pela segunda vez, seu referencial de figura paterna. A carga de culpa aterradora e o anseio de vingança que nascem no garoto Parker a partir daí são definitivos para que ele se reconheça enquanto herói e vista o manto dos grandes poderes e grandes responsabilidades. No filme de Marc Webb, no entanto, a morte de Ben Parker (Martin Sheen) acontece de maneira gratuita e os efeitos ora devastadores desta perda, são pálidos, quase imperceptíveis. Se isso desperdiça vínculos entre o personagem e a plateia, a relação com a Tia May de Sally Fields não fica muito atrás.

3) Ausência de conflito romântico

Veja só: Gwen Stacy é uma pequena gênia que ama Parker genuinamente e jamais complica a vida do herói sendo utilizada como isca por duendes voadores ou cientistas de tentáculos. Em vez disso ela reúne seus dotes em favor da causa e ajuda pontualmente, em vez de atrapalhar. Ótimo? Não, péssimo. É só lembrar de Mary Jane, o amor platônico de um nerd loser. É uma garota que sofre abusos do pai alcoólatra, é idealista, sonha em ser atriz (mas vira garçonete), descobre amar Parker (mas eventualmente está namorando outro cara) e é alvo dos vilões que querem a cabeça de Spidey numa bandeja de prata. Sentiu a diferença? O cinema bebe na fonte do amor idealizado - que aparecia nas poesias toscamente declamadas e na dor de cotovelo do antigo Pete. 

Pra onde vai a nova jornada?

O Novo Aranha é um filme sobre um adolescente numa fantasia, aos poucos se reconhecendo enquanto herói. Ao vestir-se de Homem-Aranha, Peter Parker continua sendo Peter Parker: franzino, falível, que leva tiro, se machuca gravemente, faz piada, tem espírito de aventura. O Homem-Aranha de Andrew Garfield usa mochila e tira a máscara toda hora... a intenção de aproximar herói e alter-ego fica clara. Só não descamba no conceito do Kick-Ass pela famigerada picada da aranha radioativa. Essa talvez seja a diferença-base em relação aos filmes anteriores. E aí, lá vai: nada de mocinhas gostosas e indefesas gritando por socorro, nada de redator surtado publicando manchetes levianas, nada de entrega de pizza desastrada. Tudo que é caricatura fica pra trás. As cores aqui são mais sóbrias, o tom é mais realista, a violência é mais ameaçadora. Similaridades com o tom empregado por Christopher Nolan no Novo Batman que aqui, infelizmente, não chegam perto do efeito. 

[Esse post é um oferecimento de Apontador Cego, o blog de ilustrações de cinema mais legal que existe :D].