quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

O Mundo de Sofia: Um Lugar Qualquer



Filme muito curioso, esse Um Lugar Qualquer (Somewhere, 2010), de Sofia Coppola. A história é assim: um astro de Hollywood, tragado pela rotina de celebridade, vive como um vegetal na própria pele de galã.  O rosto de Johnny Marco (Stephen Dorff) é famoso em todo canto. Ele trafega por Los Angeles na sua Black Ferrari e é cortejado a todo momento, enquanto bebe e fuma em sua enorme suíte do Hotel Chateau Marmont, na crista agitada da Sunset Boulevard.

Não demora muito pra que a gente perceba que o cara não passa de um produto manipulado à revelia por um batalhão de assessores, agentes, produtores e intermediários de toda sorte. Ele atravessa o saguão do aeroporto ladeado por truculentos seguranças, recebe visitas de poledancers em shows exclusivos, viaja para premiéres; mas todo o glamour envolvido corresponde apenas à superfície: Johnny está sempre à mercê da própria carreira, vivendo à margem de si mesmo.


É então que precisa conviver com sua filha de 11 anos, a adorável Cleo (Elle Fanning, irmã caçula de Dakota Fanning). E o contato de sentimento tão legítimo entre pai e filha (neste caso, de uma figura endeusada com uma pessoa do ‘mundo real’) representa uma profunda oxigenação na vida do sujeito. A garota excepcionalmente comum (leitora de Stephenie Meyer, para não fugir do clichê da idade) é a âncora que mantém Johnny Marco de certa maneira preso à própria existência.


Mas o que torna o filme um material curioso é a forma como toda essa informação é transmitida. Em muitas cenas, a diretora economiza nos diálogos (nada disso é explicado verbalmente) e utiliza em larga escala, sequências longas, quase sem falas, que traduzem o tédio e a mesmice presentes no cotidiano do personagem - destaque aqui para o bom trabalho de trilha sonora.  Assim, acompanhamos  um homem em sua rotina de um vazio interminável, que vai sendo intercalada pelos momentos de realidade autêntica ao lado da filha.

Se isto não é atrativo suficiente, cabe uma pergunta meio prática: como um filme com tantas tomadas estendidas e paradonas, sem reviravoltas ou ‘lições de moral’, onde ‘nada demais acontece’, consegue ser tão agradável? Esta é a mágica de Sofia. Não se trata de uma obra-prima inesquecível e talvez não seja a melhor escolha pra um dia sonolento. Mas se você decidir sentar e apreciar este recorte da vida de um certo Johnny Marco vai ter, sem dúvida, um passeio muito agradável. E de Ferrari, beijos.



***
Notas:

Por razões claras, Um Lugar Qualquer remete muito a Encontros e Desencontros, um trabalho anterior de Sofia Coppola, onde Bill Murray (muso supremo) vive uma versão tardia deste Johnny Marco.  É a desculpa perfeita pra revisitar o TOP5 Bill Murray!

Este post foi escrito ao som de The Strokes e Phoenix. Ambos constam na trilha do filme.

Muito obrigado pelos comentários e visitas dos senhores e senhoras. Em breve pitacos sobre o Oscar 2011. Té mais ;)

5 comentários:

  1. "E de Ferrari, beijos." Hahahaha. Terminou bem demais!

    Nossa, Dave... É exatamente isso, do último parágrafo. Um filme agradabilpissimo e quase todo descritivo. Também gostei muito.

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  2. E a vida precisa de factos extraordinários para ser vida? Ele trabalha com espetáculos e sabe que não. O sonho de um refém dos holofotes é derramar catchup na camisa e ninguém se dar conta.

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  3. Quase melhor que o filme, foi sua descrição. Perfeita. Ouvi por aí que o filme é pretensioso e pseudo-profundo, mas o que chama atenção realmente é o tédio que passa até na forma de contar. Bem ''recorte da vida'' como vc disse. Genial.
    (adorei - garota comum - leitora de crepúsculo hahah)

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  4. "como um filme com tantas tomadas estendidas e paradonas, sem reviravoltas ou ‘lições de moral’, onde ‘nada demais acontece’, consegue ser tão agradável?"

    Não tem descrição melhor para esse filme. Nao sou muito de curtir filmes tão parados, mas estava tentando explicar para um amigo meu o que é esse filme. Ele dá simplesmente uma grande paz.

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  5. LO bueno de este film es la pasión que la pareja le pone a la relación, además de los problemas que ellos encuentran a lo largo de la relación.

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