sexta-feira, 2 de julho de 2010

A Onda Vampiresca e alguns goles de Tru Blood


Quer queira, quer não, depois que Crepúsculo, a série de livros de Stephenie Meyer, ganhou as telas de cinema e conquistou um exército de devotados fãs, uma profusa leva de materiais sobre o universo vampiresco passou a pipocar nas TVs e telonas. A pegajosa balada de amor romântico entre Edward Cullen e Bella Swan funcionou como o mais nefasto ‘Efeito Caixa de Pandora’: diversos estúdios arregaçaram as mangas numa produção em massa de séries, livros e filmes objetivando alcançar o filão de consumidores, ávidos por similares de presas e pele pálida.
Há rumores sobre refilmagens de Drácula; Tim Burton engendrando-se num remake sobre um clássico de vamps; a versão americana de ‘Deixa Ela Entrar’ já está na esteira... Diante de tanto, Bela Lugosi, imagino, deve estar que não se aguenta de faniquitos sob a cripta.
É que os admiradores mais arredios dos clássicos contos sobre vampiros, talhados com muito esmero desde meados do século XIX, acusam Meyer de ter desfigurado o mito, ao construir uma imagem de vampiro desfocada e unidimensional: Edward, o tacanho protagonista de Crepúsculo, brilha harmonicamente quando exposto à ação dos raios solares – à diferença dos confrades de Nosferatu, criaturas das trevas, que ardiam, condenados, diante do sol.
A controvérsia se estende ainda aos amantes da sétima arte, que praguejam e lamentam a marcha de filmes eminentemente apelativos, paupérrimos de estilo ou personalidade, que despejam rios de melodrama sobre a cabeça de um vulnerável público adolescente. Felizmente, como que por probabilidade, há aproveitáveis nessa enxurrada sanguinolenta.


O exemplo mais proeminente, talvez seja mesmo a ‘True Blood’, de Alan Ball. O produtor, roteirista, ator e diretor estadunidense ganhou projeção mundial com o Oscar que recebeu pelo roteiro de ‘Beleza Americana’ (1999). Ainda me causa certa aflição, confesso, que Ball tenha cedido à coqueluche suga-sangue, uma vez que foi ele o responsável por uma das melhores séries de todos os tempos - e minha preferida, sem dúvida – ‘A Sete Palmos’ (Six Feet Under 2000 – 2005), sobre uma família que trabalha com serviços funerários. Mas True Blood é ótima surpresa.
A série se passa em Bon Temps, um lugar fictício, situado no estado da Louisiana, onde humanos e vampiros podem co-existir graças a ‘TruBlood’, um sangue sintético vendido em adoráveis garrafinhas (parecem longnecks); uma invenção de cientistas japoneses que permite que os vamps não precisem atacar humanos à revelia para se alimentar. Trunfo.
A estrutura é parecida com a usada em A Sete Palmos: tem-se os personagens-âncora (uns seis) interagindo entre si, mas cada um deles tem seu próprio núcleo, com argumentos próprios. É como se fossem várias séries dentro de uma só. Isso não só requer personagens mais profundos, como atribui densidade e conteúdo à trama.


A protagonista é Sookie Stackhouse (Anna Paquin, que foi premiada pelo Oscar de coadjuvante ainda bem novinha, pela atuação no ótimo 'O Piano', de 1993), uma garçonete telepata que guarda um fascínio particular por vampiros. Parece uma dádiva conseguir ouvir o que os outros pensam, mas Sookie demonstra quão degradante pode ser ter acesso ao que terceiros realmente pensam a seu respeito. Trunfo.
Quando ela conhece o vampiro Bill Compton, do alto da maturidade conquistada em 140 anos de vida (!) e descobre que não consegue decifrar os sinais dos seus pensamentos, a moça se envolve. O silêncio.
Este é o mote, mas nem sempre o casal principal está sob o foco de TrueBlood. É possível gastar horas falando dos demais personagens, como o andrógino Lafayette, que nas horas vagas faz contrabando de V.Juice aka sangue de vampiro. O sangue dos vampiros é absurdamente valioso por possuir propriedades cicatrizantes, além de um altíssimo grau de entorpecimento. É um elixir de cocaína, praticamente. E esse é um terceiro Trunfo!. É quase uma inversão: aos humanos, o sangue dos vampiros também é artigo de luxo.


Além disso, Jason Stackhouse, irmão de Sookie, um personagem durão e mulherengo, mas extremamente ingênuo e volúvel, acaba aderindo a uma espécie de Seita/Igreja fundamentalista, Fellowship of the Sun, que prega um ódio velado aos vampiros – e por trás disso, um poderoso plano de extermínio. Trunfo! Qualquer semelhança com a perseguição de cultos a minorias, não é mera coincidência.
A primeira temporada de TrueBlood é impecável e merece ser vista. Enquanto os primeiros episódios da terceira temporada vão sendo liberados, numa campanha publicitária que é criatividade pura, vou conferindo a segunda temporada. Embora ainda tenha muito a acontecer, a série de Alan Ball é uma prova deliciosa de que toda regra tem exceção. Veja a abertura e sua música viciante. Até ;)

4 comentários:

  1. Dave, ótimo texto... Você disse tudo! Quando assiti Crepúsculo, não entendi o sucesso... Não tem história, personagens chatos.

    True Blood é outra coisa, tem uma mitologia por trás de tudo. òtimos personagens, e que só melhoram a cada temporada. Eric é um exemplo disso, na segunda temporada ele rouba a cena.

    Tem também The Vampire Diaries, que podemos dizer ser Crepúsculo melhoirado.

    realmente, muitos filmes e séries vindo por aí, vamos ver até quando dura essa onda.

    Abraço.

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  2. Eu não me preocupo muito com essas ondas. Como você disse, elas trazem muito lixo, mas também arrastam algumas pérolas, é claro.

    Anna Paquin é uma protagonista muito cativante. Adoro seus dentes separados, sua singeleza e tal. A Tara e o Jason também são sensacionais. Acho que True Blood ganha a gente aí... Num elenco pra ninguém botar defeito e personagens críveis, apesar de todo o vampirismo envolvido.

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  3. Muito medo desse possível projeto envolvendo Tim Burton+vampiros. A versão americana de Deixa Ela Entrar já está fadada ao fracasso desde que alguém pensou: "vamos fazer uma versão anglófona de Deixa Ela Entrar?". E veja bem, não sei se tu sabe - deve saber -, mas True Blood, assim como Crespúsculo, é baseado numa série de livros, só que mais antigos do que os da fada Ed. Não dá pra saber quando o Alan Ball pegou esses livros pra ler e achou que seria interessante adaptá-los, né? Mas vamos dá um crédito pra ele e pensar que foi antes dessa onda crepuscular, ok? True Blood não é dispensável como a maior parte dos produtos dessa onda vampiresca, porque é como toda boa série/filme de vampiro, zumbis, lobisomens, monstros da florestas, ETs e etc deveria ser, algo que usa criaturas e situações fantásticas pra tatar metaforicamente assuntos e temas relevantes. Claro que ser da hbo, ter bons atores e ser escrita pelo Alan Ball também ajuda xD

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  4. Querido Dave,
    Excelente post. Crepúsculo é um lixo e exatamente por isso é um sucesso. Vejo true blood única e exclusivamente por causa do sexo.No mais, haverá sempre em todos os tempos ondas de obsessão com histórias vampirescas no cinema. Nesses meus balzacos anos de vida, esta é a terceira onda que presencio. Me lembro de A Hora do Espanto e Garotos Perdidos nos anos 80. Drácula de Bram Stoker e Entrevista com Vampiro nos anos 90 (meus preferidos) e agora essa coisa de Crepúsculo, Vimpire Diaries e Trueblood. A única diferença de uma onda para a outra é que cada vez mais o Mercado aprende a capitalizar melhor o mito e como os jovens são sempre os mais estúpidos na hora de gastar dinheiro, as tramas tem se direcionado para esse tipo de público. Beijos, queridão!

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